Eles são de modo geral magros, famintos, feiosos, e experientes rasgadores de sacolas: comem o que há para comer. Têm uma orelha caída e a outra levantada. Mancam de uma pata. O banho é da chuva, que só piora o aspecto e levanta um cheiro tão deles que é conhecido pelo nome que têm. Esses cachorros de rua, lobos da cidade, asselvajados, seus instintos atiçados por conta da falta de coleira, fora o que aprendem de moderno por força da necessidade, como a destemida arte de atravessar as ruas desviando dos carros, são bichos que criados pelo homem e abandonados pelo homem aprenderam a levar em relação a nós uma vivência paralela.
São um efeito secundário da urbanização, como os mendigos, porque em cidade pequena quem é bêbado e doido todo mundo sabe quem é, e filho ou tio de quem é, assim, não se deixa dormir na rua quem se conhece, mesmo que seja para não dizerem que a família não tem dó. Também os cachorros na roça têm cada um a sua casa, ainda que só passem por ela para rapar o resto do almoço.
A experiência da rua ensinou por costume a esquivar das pernas das pessoas: sempre esperam um chute. Mas nem todos são de uma diplomacia tão esquiva com o ser humano, uns deles são companheiros fiéis de homens que também são de rua, e formam entre si a matilha de vira-latas mais original.
Sem vacina e xampu, não têm inveja dos cães das casas que olham através das grades nos jardins, e às vezes oferecem uma cheirada focinho a focinho, um cumprimento entre indivíduos de uma espécie sem preconceitos. Imperadores das noites vazias, perturbando as madrugadas das pessoas de bem, combatendo por fêmeas no cio disputadas a rosnados e agudos caninos que ameaçam a carne inimiga – no meio da confusão, até o que o rabo caiu amputado pelas bicheiras acredita que tem a sua chance; eles vivem pouco, média de três anos, é o que se diz, mas plenos de uma coisa que se pode chamar, sem preocupação com estilo, de “cachorridade”.
São um efeito secundário da urbanização, como os mendigos, porque em cidade pequena quem é bêbado e doido todo mundo sabe quem é, e filho ou tio de quem é, assim, não se deixa dormir na rua quem se conhece, mesmo que seja para não dizerem que a família não tem dó. Também os cachorros na roça têm cada um a sua casa, ainda que só passem por ela para rapar o resto do almoço.
A experiência da rua ensinou por costume a esquivar das pernas das pessoas: sempre esperam um chute. Mas nem todos são de uma diplomacia tão esquiva com o ser humano, uns deles são companheiros fiéis de homens que também são de rua, e formam entre si a matilha de vira-latas mais original.
Sem vacina e xampu, não têm inveja dos cães das casas que olham através das grades nos jardins, e às vezes oferecem uma cheirada focinho a focinho, um cumprimento entre indivíduos de uma espécie sem preconceitos. Imperadores das noites vazias, perturbando as madrugadas das pessoas de bem, combatendo por fêmeas no cio disputadas a rosnados e agudos caninos que ameaçam a carne inimiga – no meio da confusão, até o que o rabo caiu amputado pelas bicheiras acredita que tem a sua chance; eles vivem pouco, média de três anos, é o que se diz, mas plenos de uma coisa que se pode chamar, sem preocupação com estilo, de “cachorridade”.
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